TEXTO: A Pesquisa e o Overbooking1 (Adaptado).
Gilberto Perez Cardoso2
Pesquisa recentemente realizada pelo IBRC (Instituto Brasileiro de Relações com o Cliente), e divulgada no jornal “O Globo” em sua edição de 29 de junho de 2008, faz referência a queixas frequentes de pacientes com respeito ao atendimento médico em consultórios, com destaque especial para o que os pacientes especificam como “desatenção” e “demora em ser atendido”.
Diz ainda o IBRC, na reportagem, que “quando o paciente não se sente acolhido, não cria confiança e acaba buscando uma segunda opinião com outro médico ou pede para fazer exames complementares para sentir-se mais seguro”. Isso terminaria por onerar o sistema, com prejuízo para todos [...].
Apesar da tecnologia, da precisão diagnóstica e dos inegáveis avanços terapêuticos, os pacientes se ressentiam de mais atenção por parte do médico. Atenção não significa necessariamente tempo muito longo de consulta, mas qualidade de contato e uma boa relação médico-paciente [...].
Na pesquisa, o IBRC ouviu 1800 pacientes no Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte. Os pacientes foram entrevistados à saída de consultas em 600 consultórios médicos e em 300 ambulatórios de hospitais particulares, em oito especialidades: clínica médica, cardiologia, gastroenterologia, endocrinologia, otorrinolaringologia, pediatria, ginecologia e ortopedia [...].
A pesquisa traz ainda dados curiosos, interessantes para conhecimento por parte dos médicos. Um dos aspectos refere-se a como os pacientes estão escolhendo seus médicos atualmente: 30,7% disseram que foi por indicação; 18,8% responderam que o que contou foi disponibilidade de agenda e, para 22,8%, proximidade do consultório; para 12,9%, o que importou foi o atendimento telefônico. Digno de nota foi o fato constatado de que apenas 5% disseram ter escolhido o médico por sua reputação [...].
Aliás, lamentavelmente, parece já distante o tempo de “médico e paciente”; estamos na era do “prestador e cliente”, ou (pior ainda) “fornecedor e consumidor”. Espero já não mais estar neste mundo no dia em que o paciente virar “freguês”[...] Tais constatações já são intuitivamente do conhecimento de todos nós. Preocupante é a pouca valorização da formação do médico. Esta deveria ser mais enaltecida, embora o que mais valha mesmo seja a boa ou má experiência do paciente ao longo do tratamento com o profissional [...].
Médicos com grande facilidade de comunicação conseguem compensar muitas deficiências. Por outro lado, seria muito oportuna uma outra pesquisa, agora aplicada aos médicos, de forma que estes pudessem, da mesma maneira, se manifestar sobre suas condições de trabalho em consultório, se estão ou não satisfeitos e também (por que não?) o que pensam sobre os pacientes que atendem atualmente em seus ambientes de trabalho.
Informalmente eu poderia dizer que os médicos também têm queixas dos pacientes que os procuram. Falo isso descontando devidamente o fato de que os médicos são profissionais treinados para compreender e tolerar comportamentos os mais diversos por parte dos pacientes. A pessoa enferma pode estar deprimida, agitada, angustiada, agressiva ou alterada, justificando muitos comportamentos conhecidos por nós durante um atendimento, seja em consultório, seja em outros ambientes. Entretanto, ouço muitas e frequentes queixas de colegas com respeito a alguns comportamentos por parte dos pacientes que não se justificam. Danos a objetos na sala de espera sem sequer pedidos de desculpas têm acontecido; o mesmo pode ser dito com relação ao uso indevido e, às vezes, depredatório de lavatórios e banheiros. Contudo, a reclamação que se constitui campeã na pesquisa informal que fiz com colegas foi o frequente e injustificável hábito dos pacientes marcarem consulta, terem a consulta confirmada na véspera ou mesmo no dia e, assim mesmo, faltarem ao compromisso, sem qualquer aviso ou explicação [...]. Isso merece e necessita de solução a curto prazo.
Disponível em < http://www.imaginologia.com.br/dow/Queixas-de-pacientes-ao-Atendimento-Medico.pdf Acesso em: 12 out. 2015
1 Overbooking é uma expressão em inglês que significa excesso de reservas, que acontece quando a venda ou reserva de bilhetes ou passagens fica acima do número de lugares realmente disponíveis no veículo ou lugar. http://www. significados.com.br/overbooking/ Acesso em 26 out 2015
2 Dr. Gilberto Perez Cardoso médico endocrinologista e professor titular do departamento de Clínica Médica da Universidade Federal Fluminense. Artigo originalmente publicado na Revista Conduta Médica, Out. Nov. Dez., 2008, nº. 38.
Leia: “Um dos aspectos refere-se a como os pacientes estão escolhendo seus médicos atualmente” (texto). A ironia pode ser entendida como o uso do sentido para representar o oposto do que se deveria esperar. Assinale a alternativa em que está implícita a ironia da ideia destacada.