O ex-governante líbio Muammar Kadafi, morto [recentemente], foi uma das personagens mais controvertidas do século passado e início deste século. Nas décadas de 1970 e 1980, Kadafi patrocinou ataques terroristas, tentou desestabilizar países árabes e africanos vizinhos, além de provocar uma guerra de dois meses contra o Egito em 1977. Kadafi nacionalizou a indústria petrolífera da Líbia em 1973, quatro anos após assumir o poder em um golpe de Estado, que extinguiu a monarquia no país do Magreb. Além disso, melhorou sensivelmente o padrão da vida do povo líbio, que era um dos mais pobres não apenas da região do Mediterrâneo, mas do mundo inteiro, até a década de 1970. A crise econômica mundial de 2008, somada à alta nos preços dos alimentos, contudo, minou o padrão de vida dos líbios - muitos dos quais ainda vivem numa sociedade onde o controle tribal é forte. [...] Na década de 1990, Kadafi mergulhou no ostracismo no cenário internacional e começou a realizar um trabalho modesto para limpar sua imagem. O preço relativamente baixo do petróleo na década passada empobreceu novamente a Líbia e aumentou as pressões sociais sobre seu governo.
Reabilitado com o Ocidente, Kadafi estava moderado. As empresas europeias e norteamericanas haviam voltado a explorar o petróleo líbio. Nada indicava que a Líbia, uma sociedade bem mais tribal que seus vizinhos Tunísia e Egito, e também bem mais rica, seria engolfada pela onda de rebeliões que tomou conta do Oriente Médio e do Magreb na Primavera Árabe. O governante afirmou que foi “traído” pelos EUA, França, Grã-Bretanha e Itália, que apoiaram os insurgentes em Benghazi. [...]
Nascido em 1942 em uma família de beduínos que havia lutado contra a colonização italiana da Líbia, Kadafi estudou na escola militar do reino da Líbia, formada após a independência do país em 1951, sob a monarquia do rei Idris. Sua formação política ocorreu no contexto do pan-arabismo, a teoria que teve seu expoente máximo no presidente egípcio Gamal Abdel Nasser, líder da revolução egípcia de 1953. [...]
Bem antes dos atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001, Kadafi passou a adotar um discurso conciliador com o Ocidente e condenou o terrorismo e o extremismo islâmico. Em 1993, por exemplo, a Líbia rompeu relações diplomáticas com o Irã, por discordar da interpretação linha-dura do Alcorão adotada pelos aiatolás xiitas de Teerã. [...]
Em 2006, em outra medida sem precedentes, a Líbia reabriu seus ricos poços petrolíferos à exploração de empresas ocidentais.
O movimento de reaproximação com o Ocidente culminou, em 2009, com a visita de Kadafi a Roma e do premiê italiano Silvio Berlusconi a Tripoli — o governo líbio, acionista da montadora italiana Fiat e do banco Unicredit, assinou uma série de acordos comerciais com a Itália e os dois países decidiram relançar as relações. Ex-colônia italiana entre 1911 e 1943, a Líbia guardou ressentimento pela ocupação italiana, que foi particularmente sangrenta na década de 1920, quando milhares de beduínos foram mortos no campo de concentração de El-Aglaiba.
(POLÊMICO, 2011).
O século XX foi marcado por transformações nas relações internacionais, que vieram estabelecer um novo panorama mundial.
Nesse contexto, se destaca