UECE 2012/2
66 Questões
TEXTO I
Um movimento entre a ruptura estética e o valor do passado
[1] RIO - Falar em modernismo brasileiro é
mais do que localizar no país tendências
artísticas de pretensões universais. O brasileiro
é a marca fundamental pela qual o
[5] movimento, aqui, se garantiu modernista.
Pensar no nosso modernismo é pensar no
folclore do "Macunaíma" (1928) de Mário de
Andrade e da música de Villa-Lobos; na
antropofagia de Oswald de Andrade e do
[10] "Abaporu" (1928) de Tarsila do Amaral,
retomada pela Tropicália. Antes de tudo isso,
até hoje o marco do movimento no imaginário
corrente é a Semana de Arte Moderna de
1922. Só que naqueles dias 13, 15 e 17 de
[15] fevereiro de 90 anos atrás, a ideia de
brasilidade era apenas um borrão. O Brasil
ainda era sobretudo um país cujo atraso
deveria ser superado — mesmo que os
"passadistas" a serem combatidos estivessem
[20] na plateia do Teatro Municipal de São Paulo,
representados pela elite cafeeira financiadora
da programação de artes, música e literatura
da Semana, no ano do centenário da
independência.
[25] Em "A brasilidade modernista: sua
dimensão filosófica" — que, publicado
originalmente em 1978, será reeditado em
março pela Móbile —, Eduardo Jardim trata de
dois tempos do modernismo brasileiro.
[30] Segundo ele, a partir de 1917, havia uma
preocupação imediatista com a inserção na
ordem moderna internacional, com uma forte
ideia de ruptura, norteadora da Semana de
1922. Já a partir de 1924, molda-se um
[35] caminho construtivo para essa inserção, o da
particularidade nacional — e então a tradição
cultural brasileira passa a ter valor.
— No primeiro momento, a oposição de
modernismo e passadismo é muito clara —
[40] afirma Jardim. — A discussão era como
modernizar a produção cultural brasileira pela
absorção de recursos expressivos modernos.
Em 1924, já se percebe que essa perspectiva
não vai funcionar, e que se pode assegurar a
[45] entrada numa ordem universal por uma
mediação dos traços nacionais. Esses traços
perduram ao longo do tempo, como o folclore.
Isso faz com que a ideia de ruptura seja
revista.
[50] O "primeiro momento" do modernismo —
que Mário de Andrade, em 1942, chamaria de
"tempo destruidor" — é contado pelo jornalista
Marcos Augusto Gonçalves em "1922 — A
semana que não terminou", que a Companhia
[55] das Letras lança na próxima sexta, dia 10.
Numa reportagem de cunho histórico, ele
explora a rede de relações que culminou na
Semana, inaugurada com uma exposição de
artistas como Victor Brecheret, Di Cavalcanti e
[60] Anita Malfatti.
Depois de estudos em Berlim e Nova York,
Anita abrira em 1917 — ano que Jardim usa
como início desse primeiro tempo — a primeira
mostra no país a se autodenominar moderna,
[65] que entrou para a História pela crítica feroz de
Monteiro Lobato. O escritor condenou aquela
"arte caricatural" tipicamente europeia,
vinculando-a à perturbação mental. Já para
Oswald, sua pintura causava "impressão de
[70] originalidade e de diferente visão". Mais do
que por características próprias, naquele
momento a obra era moderna sobretudo por
ser diferente — e essa diferença ainda era, em
grande medida, representada pelo que se
[75] criava lá fora.
Lobato defendia um caminho próprio para a
arte brasileira — e o "moderno" era sinônimo
de estrangeiro. Seu nacionalismo se voltava
para o mundo rural paulista, representado por
[80] artistas como Almeida Júnior (1850-1899),
mas a São Paulo que se projetava na jovem
República era a cidade industrial, do
progresso.
http://oglobo.globo.com/cultura/um-movimentoentre-ruptura-estetica-o-valor-do-passado-3873586
Considerando as informações veiculadas pelo texto, atente para as afirmações seguintes:
I. A Semana de Arte Moderna foi intrinsecamente contraditória, por receber financiamento dos representantes do passadismo que iria combater.
II. A tentativa de fortalecer a literatura nacional falhou no primeiro momento do Modernismo, cujo objetivo foi trazer para o Brasil tendências universais.
III. Nos três dias da Semana, a ideia de brasilidade diluiu-se no combate aos valores literários do passado.
Está correto o que se diz em
TEXTO I
Um movimento entre a ruptura estética e o valor do passado
[1] RIO - Falar em modernismo brasileiro é
mais do que localizar no país tendências
artísticas de pretensões universais. O brasileiro
é a marca fundamental pela qual o
[5] movimento, aqui, se garantiu modernista.
Pensar no nosso modernismo é pensar no
folclore do "Macunaíma" (1928) de Mário de
Andrade e da música de Villa-Lobos; na
antropofagia de Oswald de Andrade e do
[10] "Abaporu" (1928) de Tarsila do Amaral,
retomada pela Tropicália. Antes de tudo isso,
até hoje o marco do movimento no imaginário
corrente é a Semana de Arte Moderna de
1922. Só que naqueles dias 13, 15 e 17 de
[15] fevereiro de 90 anos atrás, a ideia de
brasilidade era apenas um borrão. O Brasil
ainda era sobretudo um país cujo atraso
deveria ser superado — mesmo que os
"passadistas" a serem combatidos estivessem
[20] na plateia do Teatro Municipal de São Paulo,
representados pela elite cafeeira financiadora
da programação de artes, música e literatura
da Semana, no ano do centenário da
independência.
[25] Em "A brasilidade modernista: sua
dimensão filosófica" — que, publicado
originalmente em 1978, será reeditado em
março pela Móbile —, Eduardo Jardim trata de
dois tempos do modernismo brasileiro.
[30] Segundo ele, a partir de 1917, havia uma
preocupação imediatista com a inserção na
ordem moderna internacional, com uma forte
ideia de ruptura, norteadora da Semana de
1922. Já a partir de 1924, molda-se um
[35] caminho construtivo para essa inserção, o da
particularidade nacional — e então a tradição
cultural brasileira passa a ter valor.
— No primeiro momento, a oposição de
modernismo e passadismo é muito clara —
[40] afirma Jardim. — A discussão era como
modernizar a produção cultural brasileira pela
absorção de recursos expressivos modernos.
Em 1924, já se percebe que essa perspectiva
não vai funcionar, e que se pode assegurar a
[45] entrada numa ordem universal por uma
mediação dos traços nacionais. Esses traços
perduram ao longo do tempo, como o folclore.
Isso faz com que a ideia de ruptura seja
revista.
[50] O "primeiro momento" do modernismo —
que Mário de Andrade, em 1942, chamaria de
"tempo destruidor" — é contado pelo jornalista
Marcos Augusto Gonçalves em "1922 — A
semana que não terminou", que a Companhia
[55] das Letras lança na próxima sexta, dia 10.
Numa reportagem de cunho histórico, ele
explora a rede de relações que culminou na
Semana, inaugurada com uma exposição de
artistas como Victor Brecheret, Di Cavalcanti e
[60] Anita Malfatti.
Depois de estudos em Berlim e Nova York,
Anita abrira em 1917 — ano que Jardim usa
como início desse primeiro tempo — a primeira
mostra no país a se autodenominar moderna,
[65] que entrou para a História pela crítica feroz de
Monteiro Lobato. O escritor condenou aquela
"arte caricatural" tipicamente europeia,
vinculando-a à perturbação mental. Já para
Oswald, sua pintura causava "impressão de
[70] originalidade e de diferente visão". Mais do
que por características próprias, naquele
momento a obra era moderna sobretudo por
ser diferente — e essa diferença ainda era, em
grande medida, representada pelo que se
[75] criava lá fora.
Lobato defendia um caminho próprio para a
arte brasileira — e o "moderno" era sinônimo
de estrangeiro. Seu nacionalismo se voltava
para o mundo rural paulista, representado por
[80] artistas como Almeida Júnior (1850-1899),
mas a São Paulo que se projetava na jovem
República era a cidade industrial, do
progresso.
http://oglobo.globo.com/cultura/um-movimentoentre-ruptura-estetica-o-valor-do-passado-3873586
Tendo em vista as ideias do texto, marque a opção que completa corretamente a seguinte frase:
O Modernismo brasileiro se firmou
TEXTO I
Um movimento entre a ruptura estética e o valor do passado
[1] RIO - Falar em modernismo brasileiro é
mais do que localizar no país tendências
artísticas de pretensões universais. O brasileiro
é a marca fundamental pela qual o
[5] movimento, aqui, se garantiu modernista.
Pensar no nosso modernismo é pensar no
folclore do "Macunaíma" (1928) de Mário de
Andrade e da música de Villa-Lobos; na
antropofagia de Oswald de Andrade e do
[10] "Abaporu" (1928) de Tarsila do Amaral,
retomada pela Tropicália. Antes de tudo isso,
até hoje o marco do movimento no imaginário
corrente é a Semana de Arte Moderna de
1922. Só que naqueles dias 13, 15 e 17 de
[15] fevereiro de 90 anos atrás, a ideia de
brasilidade era apenas um borrão. O Brasil
ainda era sobretudo um país cujo atraso
deveria ser superado — mesmo que os
"passadistas" a serem combatidos estivessem
[20] na plateia do Teatro Municipal de São Paulo,
representados pela elite cafeeira financiadora
da programação de artes, música e literatura
da Semana, no ano do centenário da
independência.
[25] Em "A brasilidade modernista: sua
dimensão filosófica" — que, publicado
originalmente em 1978, será reeditado em
março pela Móbile —, Eduardo Jardim trata de
dois tempos do modernismo brasileiro.
[30] Segundo ele, a partir de 1917, havia uma
preocupação imediatista com a inserção na
ordem moderna internacional, com uma forte
ideia de ruptura, norteadora da Semana de
1922. Já a partir de 1924, molda-se um
[35] caminho construtivo para essa inserção, o da
particularidade nacional — e então a tradição
cultural brasileira passa a ter valor.
— No primeiro momento, a oposição de
modernismo e passadismo é muito clara —
[40] afirma Jardim. — A discussão era como
modernizar a produção cultural brasileira pela
absorção de recursos expressivos modernos.
Em 1924, já se percebe que essa perspectiva
não vai funcionar, e que se pode assegurar a
[45] entrada numa ordem universal por uma
mediação dos traços nacionais. Esses traços
perduram ao longo do tempo, como o folclore.
Isso faz com que a ideia de ruptura seja
revista.
[50] O "primeiro momento" do modernismo —
que Mário de Andrade, em 1942, chamaria de
"tempo destruidor" — é contado pelo jornalista
Marcos Augusto Gonçalves em "1922 — A
semana que não terminou", que a Companhia
[55] das Letras lança na próxima sexta, dia 10.
Numa reportagem de cunho histórico, ele
explora a rede de relações que culminou na
Semana, inaugurada com uma exposição de
artistas como Victor Brecheret, Di Cavalcanti e
[60] Anita Malfatti.
Depois de estudos em Berlim e Nova York,
Anita abrira em 1917 — ano que Jardim usa
como início desse primeiro tempo — a primeira
mostra no país a se autodenominar moderna,
[65] que entrou para a História pela crítica feroz de
Monteiro Lobato. O escritor condenou aquela
"arte caricatural" tipicamente europeia,
vinculando-a à perturbação mental. Já para
Oswald, sua pintura causava "impressão de
[70] originalidade e de diferente visão". Mais do
que por características próprias, naquele
momento a obra era moderna sobretudo por
ser diferente — e essa diferença ainda era, em
grande medida, representada pelo que se
[75] criava lá fora.
Lobato defendia um caminho próprio para a
arte brasileira — e o "moderno" era sinônimo
de estrangeiro. Seu nacionalismo se voltava
para o mundo rural paulista, representado por
[80] artistas como Almeida Júnior (1850-1899),
mas a São Paulo que se projetava na jovem
República era a cidade industrial, do
progresso.
http://oglobo.globo.com/cultura/um-movimentoentre-ruptura-estetica-o-valor-do-passado-3873586
Levando em conta as informações contidas no texto sobre a exposição e Anita Malfatti, assinale V ou F, conforme seja verdadeiro ou falso o que se afirma a seguir.
( ) Oswald de Andrade e Monteiro Lobato opinaram sobre a exposição partindo de critérios antilógicos.
( ) Para Oswald de Andrade, o parâmetro de julgamento era o novo, o inusitado.
( ) Para Monteiro Lobato, o parâmetro de julgamento era a sanidade mental.
( ) A violenta reação de Monteiro Lobato à exposição deve-se ao fato de ele associar a qualidade da obra à ideia do nacionalismo.
( ) O julgamento de Oswald de Andrade e o de Monteiro Lobato foram ambos parciais.
Está correta, de cima para baixo, a sequência seguinte:
TEXTO I
Um movimento entre a ruptura estética e o valor do passado
[1] RIO - Falar em modernismo brasileiro é
mais do que localizar no país tendências
artísticas de pretensões universais. O brasileiro
é a marca fundamental pela qual o
[5] movimento, aqui, se garantiu modernista.
Pensar no nosso modernismo é pensar no
folclore do "Macunaíma" (1928) de Mário de
Andrade e da música de Villa-Lobos; na
antropofagia de Oswald de Andrade e do
[10] "Abaporu" (1928) de Tarsila do Amaral,
retomada pela Tropicália. Antes de tudo isso,
até hoje o marco do movimento no imaginário
corrente é a Semana de Arte Moderna de
1922. Só que naqueles dias 13, 15 e 17 de
[15] fevereiro de 90 anos atrás, a ideia de
brasilidade era apenas um borrão. O Brasil
ainda era sobretudo um país cujo atraso
deveria ser superado — mesmo que os
"passadistas" a serem combatidos estivessem
[20] na plateia do Teatro Municipal de São Paulo,
representados pela elite cafeeira financiadora
da programação de artes, música e literatura
da Semana, no ano do centenário da
independência.
[25] Em "A brasilidade modernista: sua
dimensão filosófica" — que, publicado
originalmente em 1978, será reeditado em
março pela Móbile —, Eduardo Jardim trata de
dois tempos do modernismo brasileiro.
[30] Segundo ele, a partir de 1917, havia uma
preocupação imediatista com a inserção na
ordem moderna internacional, com uma forte
ideia de ruptura, norteadora da Semana de
1922. Já a partir de 1924, molda-se um
[35] caminho construtivo para essa inserção, o da
particularidade nacional — e então a tradição
cultural brasileira passa a ter valor.
— No primeiro momento, a oposição de
modernismo e passadismo é muito clara —
[40] afirma Jardim. — A discussão era como
modernizar a produção cultural brasileira pela
absorção de recursos expressivos modernos.
Em 1924, já se percebe que essa perspectiva
não vai funcionar, e que se pode assegurar a
[45] entrada numa ordem universal por uma
mediação dos traços nacionais. Esses traços
perduram ao longo do tempo, como o folclore.
Isso faz com que a ideia de ruptura seja
revista.
[50] O "primeiro momento" do modernismo —
que Mário de Andrade, em 1942, chamaria de
"tempo destruidor" — é contado pelo jornalista
Marcos Augusto Gonçalves em "1922 — A
semana que não terminou", que a Companhia
[55] das Letras lança na próxima sexta, dia 10.
Numa reportagem de cunho histórico, ele
explora a rede de relações que culminou na
Semana, inaugurada com uma exposição de
artistas como Victor Brecheret, Di Cavalcanti e
[60] Anita Malfatti.
Depois de estudos em Berlim e Nova York,
Anita abrira em 1917 — ano que Jardim usa
como início desse primeiro tempo — a primeira
mostra no país a se autodenominar moderna,
[65] que entrou para a História pela crítica feroz de
Monteiro Lobato. O escritor condenou aquela
"arte caricatural" tipicamente europeia,
vinculando-a à perturbação mental. Já para
Oswald, sua pintura causava "impressão de
[70] originalidade e de diferente visão". Mais do
que por características próprias, naquele
momento a obra era moderna sobretudo por
ser diferente — e essa diferença ainda era, em
grande medida, representada pelo que se
[75] criava lá fora.
Lobato defendia um caminho próprio para a
arte brasileira — e o "moderno" era sinônimo
de estrangeiro. Seu nacionalismo se voltava
para o mundo rural paulista, representado por
[80] artistas como Almeida Júnior (1850-1899),
mas a São Paulo que se projetava na jovem
República era a cidade industrial, do
progresso.
http://oglobo.globo.com/cultura/um-movimentoentre-ruptura-estetica-o-valor-do-passado-3873586
Os seguintes excertos foram retirados das obras de dois escritores modernistas:
1. Dezembro deu à luz das salas enceradas de tia Gabriela as três moças primas de óculos bem falados.
Pantico norte-americava.
E minha mãe entre médicos num leito de crise decidiu meu apressado viageiro do mundo.
2. A moça bonita, chamada Uiara, morava na Terra Grande.
Dizem que tinha cabelos verdes, olhos amarelos.
O mato é verde; pois os seus cabelos eram mais verdes. A flor do ipê é amarela; pois os seus olhos eram mais amarelos.
Com base no que diz o Texto I sobre as duas fases do Modernismo brasileiro, escreva 1 para o que se referir ao excerto 1; 2 para o que se referir ao excerto 2.
( ) A maneira como a linguagem foi trabalhada rompe os padrões tradicionais da linguagem literária.
( ) A introdução de uma figura do folclore empresta à obra o cunho de brasilidade que Monteiro Lobato exigia.
( ) A obra representada no excerto deve ser enquadrada na fase que Mário de Andrade chamaria de “tempo destruidor”.
( ) A obra, cujo excerto é uma amostra, atinge a modernidade pela absorção do que se criava lá fora.
( ) A obra representada pelo excerto assegura a entrada numa ordem universal por uma mediação dos traços nacionais.
Está correta, de cima para baixo, a seguinte sequência:
TEXTO II
Carta de Mário de Andrade a Carlos Drummond de Andrade
São Paulo, 10 novembro 1924
[85] Meu caro Carlos Drummond
Já começava a desesperar da minha
resposta? Meu Deus! Comecei esta carta com
pretensão... Em todo caso de mim não
desespere nunca. Eu respondo sempre aos
[90] amigos. Às vezes demoro um pouco, mas
nunca por desleixo ou esquecimento. As
solicitações da vida é que são muitas e as da
minha agora muitíssimas. Atualmente as
minhas preocupações são as seguintes:
[95] escrever dísticos estrambóticos e divertidos
prum baile futurista que vai haver na alta
roda daqui (a que não pertenço, aliás).
Escolher vestidos extravagantes mas bonitos
pra mulher dum amigo que vai ao tal baile. E
[100] escrever uma conferência sem valor mas que
divirta pra uma festa que damos, o pianista
Sousa Lima e eu, no Automóvel Clube, sexta-
feira que vem. São as minhas grandes
preocupações do momento. Serão
[105] desprezíveis pra qualquer idiota antiquado,
aguado e simbolista. Pra mim são tão
importantes como escrever um romance ou
sofrer uma recusa de amor. Tudo está em
gostar da vida e saber vivê-la. Só há um jeito
[110] feliz de viver a vida: é ter espírito religioso.
Explico melhor: não se trata de ter espírito
católico ou budista, trata-se de ter espírito
religioso pra com a vida, isto é, viver com
religião a vida. Eu sempre gostei muito de
[115] viver, de maneira que nenhuma manifestação
da vida me é indiferente. [...] Eu tanto
aprecio uma boa caminhada a pé até o alto
da Lapa como uma tocata de Bach e ponho
tanto entusiasmo e carinho no escrever um
[120] dístico que vai figurar nas paredes dum
bailarico e morrer no lixo depois como um
romance a que darei a impassível eternidade
da impressão. Eu acho, Drummond,
pensando bem, que o que falta pra certos
[125] moços de tendência modernista brasileiros é
isso: gostarem de verdade da vida. Como não
atinaram com o verdadeiro jeito de gostar da
vida, cansam-se, ficam tristes ou então
fingem alegria o que ainda é mais idiota do
[130] que ser sinceramente triste. Eu não posso
compreender um homem de gabinete e vocês
todos, do Rio, de Minas, do Norte me
parecem um pouco de gabinete demais. Meu
Deus! se eu estivesse nessas terras
[135] admiráveis em que vocês vivem, com que
gosto, com que religião eu caminharia
sempre pelo mesmo caminho (não há mesmo
caminho pros amantes da Terra) em longas
caminhadas! Que diabo! estudar é bom e eu
[140] também estudo. Mas depois do estudo do
livro e do gozo do livro, ou antes vem o
estudo e gozo da ação corporal. [...] um dos
desastres que impedem a felicidade, que é
naturalidade, de vocês está aí: em casa
[145] lendo, redação de jornal, café com amigos
sobre tal livro, tal escritor, escrever coisas
depois, talvez cinemas e depois farra com
mulheres. Isso não é vida que se leve! Isso é
vício. [...] Veja bem, eu não ataco nem nego
[150] a erudição e a civilização, como fez o Osvaldo
num momento de erro, ao contrário respeito-
as e cá tenho também (comedidamente,
muito comedidamente) as minhas fichinhas
de leitura. Mas vivo tudo. [...] E então parar
[155] e puxar conversa com gente chamada baixa e
ignorante! Como é gostoso! Fique sabendo
duma coisa, se não sabe ainda: é com essa
gente que se aprende a sentir e não com a
inteligência e a erudição livresca. Eles é que
[160] conservam o espírito religioso da vida e
fazem tudo sublimemente num ritual
esclarecido de religião. [...] li seu artigo. Está
muito bom. Mas nele ressalta bem o que falta
a você — espírito de mocidade brasileira. Está
[165] bom demais pra você. Quero dizer: está
muito bem pensante, refletido, sereno,
acomodado, justo, principalmente isso,
escrito com grande espírito de justiça. Pois eu
preferia que você dissesse asneiras,
[170] injustiças, maldades moças que nunca
fizeram mal a quem sofre delas. Você é uma
sólida inteligência e já muito bem mobiliada...
à francesa. Com toda a abundância do meu
coração eu lhe digo que isso é uma pena. Eu
[175] sofro com isso. Carlos, devote-se ao Brasil,
junto comigo.
Um abraço do
Mário de Andrade.
(Texto adaptado)
Sobre suas preocupações do momento, diz Mário de Andrade que elas Serão desprezíveis pra qualquer idiota antiquado, aguado e simbolista. Para ele, são tão importantes como escrever um romance ou sofrer uma recusa de amor (Linhas 104-108).
Assinale a única afirmativa NÃO condizente com as ideias do texto II.
TEXTO II
Carta de Mário de Andrade a Carlos Drummond de Andrade
São Paulo, 10 novembro 1924
[85] Meu caro Carlos Drummond
Já começava a desesperar da minha
resposta? Meu Deus! Comecei esta carta com
pretensão... Em todo caso de mim não
desespere nunca. Eu respondo sempre aos
[90] amigos. Às vezes demoro um pouco, mas
nunca por desleixo ou esquecimento. As
solicitações da vida é que são muitas e as da
minha agora muitíssimas. Atualmente as
minhas preocupações são as seguintes:
[95] escrever dísticos estrambóticos e divertidos
prum baile futurista que vai haver na alta
roda daqui (a que não pertenço, aliás).
Escolher vestidos extravagantes mas bonitos
pra mulher dum amigo que vai ao tal baile. E
[100] escrever uma conferência sem valor mas que
divirta pra uma festa que damos, o pianista
Sousa Lima e eu, no Automóvel Clube, sexta-
feira que vem. São as minhas grandes
preocupações do momento. Serão
[105] desprezíveis pra qualquer idiota antiquado,
aguado e simbolista. Pra mim são tão
importantes como escrever um romance ou
sofrer uma recusa de amor. Tudo está em
gostar da vida e saber vivê-la. Só há um jeito
[110] feliz de viver a vida: é ter espírito religioso.
Explico melhor: não se trata de ter espírito
católico ou budista, trata-se de ter espírito
religioso pra com a vida, isto é, viver com
religião a vida. Eu sempre gostei muito de
[115] viver, de maneira que nenhuma manifestação
da vida me é indiferente. [...] Eu tanto
aprecio uma boa caminhada a pé até o alto
da Lapa como uma tocata de Bach e ponho
tanto entusiasmo e carinho no escrever um
[120] dístico que vai figurar nas paredes dum
bailarico e morrer no lixo depois como um
romance a que darei a impassível eternidade
da impressão. Eu acho, Drummond,
pensando bem, que o que falta pra certos
[125] moços de tendência modernista brasileiros é
isso: gostarem de verdade da vida. Como não
atinaram com o verdadeiro jeito de gostar da
vida, cansam-se, ficam tristes ou então
fingem alegria o que ainda é mais idiota do
[130] que ser sinceramente triste. Eu não posso
compreender um homem de gabinete e vocês
todos, do Rio, de Minas, do Norte me
parecem um pouco de gabinete demais. Meu
Deus! se eu estivesse nessas terras
[135] admiráveis em que vocês vivem, com que
gosto, com que religião eu caminharia
sempre pelo mesmo caminho (não há mesmo
caminho pros amantes da Terra) em longas
caminhadas! Que diabo! estudar é bom e eu
[140] também estudo. Mas depois do estudo do
livro e do gozo do livro, ou antes vem o
estudo e gozo da ação corporal. [...] um dos
desastres que impedem a felicidade, que é
naturalidade, de vocês está aí: em casa
[145] lendo, redação de jornal, café com amigos
sobre tal livro, tal escritor, escrever coisas
depois, talvez cinemas e depois farra com
mulheres. Isso não é vida que se leve! Isso é
vício. [...] Veja bem, eu não ataco nem nego
[150] a erudição e a civilização, como fez o Osvaldo
num momento de erro, ao contrário respeito-
as e cá tenho também (comedidamente,
muito comedidamente) as minhas fichinhas
de leitura. Mas vivo tudo. [...] E então parar
[155] e puxar conversa com gente chamada baixa e
ignorante! Como é gostoso! Fique sabendo
duma coisa, se não sabe ainda: é com essa
gente que se aprende a sentir e não com a
inteligência e a erudição livresca. Eles é que
[160] conservam o espírito religioso da vida e
fazem tudo sublimemente num ritual
esclarecido de religião. [...] li seu artigo. Está
muito bom. Mas nele ressalta bem o que falta
a você — espírito de mocidade brasileira. Está
[165] bom demais pra você. Quero dizer: está
muito bem pensante, refletido, sereno,
acomodado, justo, principalmente isso,
escrito com grande espírito de justiça. Pois eu
preferia que você dissesse asneiras,
[170] injustiças, maldades moças que nunca
fizeram mal a quem sofre delas. Você é uma
sólida inteligência e já muito bem mobiliada...
à francesa. Com toda a abundância do meu
coração eu lhe digo que isso é uma pena. Eu
[175] sofro com isso. Carlos, devote-se ao Brasil,
junto comigo.
Um abraço do
Mário de Andrade.
(Texto adaptado)
Considere as seguintes afirmações acerca do pensamento de Mário de Andrade:
I. Condena a aprendizagem livresca, mas não a leitura.
II. Interpreta a tristeza que alguns escritores sentem ou fingem sentir como decorrência da falta da naturalidade em suas vidas.
III. Condena a vida antinatural de certos escritores.
Está correto o que se diz em