UFN 2016 Verão
71 Questões
“Selfio, logo existo”
Juan Arias
Será o ‘selfie’ uma forma freudiana de luta contra a
solidão e de busca de um sentido para a vida?
O Brasil passa por um momento paradoxal. Tem-se
a impressão de que é um vidro quebrado. A crise econô-
[5] mica que gerou a política ou, talvez, o contrário, inflama
os ânimos. Ressoam palavras duras como "ódio", "vi-
gança" ou "traição". É o gosto amargo da divisão, do "nós
contra eles", ou da queixa "deles contra nós". E, no en-
tanto, como em um mundo que vibra simultaneamente em
[10] outro diapasão, os brasileiros nunca gostaram tanto
quanto hoje de estar juntos, de ser fotografados se abra-
çando, de fazer um selfie.
Estarão essas duas sociedades condenadas a ser uma
assíntota da hipérbole, essas duas linhas que, mesmo ca-
[15] minhando juntas, nunca se encontrarão? […] Há 400 anos,
o filósofo francês Descartes, o pai da filosofia e da mate-
mática moderna, precursor do idealismo, resumiu seu
pensamento na famosa frase: "Penso, logo existo". Hoje
nosso mundo, que tem pouco a ver com o do filósofo (não
[20] sei se mais profundo e iluminado ou mais superficial),
pode dizer: "Selfio, logo sou". Refiro-me a essa febre do
autorretrato analisada por sociólogos e psicólogos, e por
aqueles que se dedicam a farejar as tendências da socie-
dade.
[25] Essa moda do selfie servirá para entender melhor o
sentido da vida de hoje, com suas contradições, sofrimen-
tos e glórias? Há poucos dias, outro filósofo francês, Cha-
rles Taylor, afirmava em uma entrevista para Frances Ar-
royo neste jornal que "as pessoas hoje não têm claro o sen-
[30] tido da vida". […] Melhor ou pior, o mundo de hoje é, no
entanto, o nosso, e não podemos fingir que não existe. E
é um mundo diferente daquele dos filósofos gregos ou la-
tinos, embora às vezes com as mesmas contradições e dú-
vidas. As crianças do futuro talvez não voltarão a escrever
[35] com as mãos. As de hoje já sabem fotografar com o celu-
lar aos 2 anos. Mudamos porque continuamos vivos. Só
os mortos não mudam.
Essa moda do selfie, que dominou com força todo o
planeta e também o Brasil, é antes de tudo algo democrá-
[40] tico, já que é usada por cidadãos de todas as categorias
sociais e de todas as classes econômicas. Do presidente da
República ao garçom do bar, do milionário ao trabalhador
pobre das favelas.
Será mais do que uma moda? Etimologicamente, o
[45] selfie, que já transformamos em verbo, era um ato indivi-
dualista, um autorretrato. Aquele narcisismo inicial deu
lugar, no entanto, a algo mais importante: à socialização
da fotografia. O selfie individual foi pluralizado. Agora
predominam os retratos de dois ou em grupo. Será uma
[50] forma inconsciente, freudiana, de lutar contra a solidão e
para estar ciente do eu também existo? Precisamos de al-
guém ao nosso lado, sem o qual nosso narcisismo inicial
ficaria vazio, puro vício solitário?
Alguém me fez observar que, enquanto nos selfies
[55] individuais podem existir fotos mais sérias, praticamente
não há selfies de casais ou de grupo nos quais os interes-
sados não estejam sorrindo. Existe uma cumplicidade es-
pontânea nesses retratos? Mesmo em selfies com uma per-
sonalidade importante, que deveriam ser sérios, as pes-
[60] soas sempre estão sorrindo.
Os selfies nos ajudam a tomar consciência em uma
sociedade de anônimos, de que somos, de que valemos
algo, embora seja através da sombra de alguém mais im-
portante do que nós? Quando o selfie ocorre entre casais
[65] que se amam, entre pais e mães encantados com seus pe-
quenos ou entre amigos, nos dá uma convicção interior de
que não apenas existimos, mas que também somos, que
nos amam, que não rejeitam nossa presença e até querem
perpetuá-la.
[70] Já sei que muitos pensarão que a filosofia e a estética
moderna do selfie parecem mais uma banalidade em com-
paração à antiga e inteligente filosofia dos gregos e roma-
nos. No entanto, não nos esqueçamos de que nosso mundo
de hoje, tão criticado pela superficialidade e injustiças, é
[75] infinitamente melhor, quase em tudo, do que o de apenas
cem anos atrás. […] Os sorrisos festivos dos selfies pode-
riam ser até uma bela profecia do desejo inconsciente de
querer buscar um sentido menos doloroso e bélico para a
vida.
[80] […] Um selfie com os leitores? Obrigado.
Fonte: EL PAÍS Brasil - 21 AGO 2015 - http://brasil.elpais.com/brasil/2015/08/21/opinion/1440181987_784618.html
Em relação ao tema do texto, é possível afirmar que:
I. Concentra-se principalmente em conceituar o termo “selfie”.
II. Estabelece uma relação entre o autorretrato e a existência humana.
III. Amplia o sentido do termo “selfie”, que deixa de se referir ao indivíduo e passa a fazer referência ao coletivo.
Está(ão) correta(s)
“Selfio, logo existo”
Juan Arias
Será o ‘selfie’ uma forma freudiana de luta contra a
solidão e de busca de um sentido para a vida?
O Brasil passa por um momento paradoxal. Tem-se
a impressão de que é um vidro quebrado. A crise econô-
[5] mica que gerou a política ou, talvez, o contrário, inflama
os ânimos. Ressoam palavras duras como "ódio", "vi-
gança" ou "traição". É o gosto amargo da divisão, do "nós
contra eles", ou da queixa "deles contra nós". E, no en-
tanto, como em um mundo que vibra simultaneamente em
[10] outro diapasão, os brasileiros nunca gostaram tanto
quanto hoje de estar juntos, de ser fotografados se abra-
çando, de fazer um selfie.
Estarão essas duas sociedades condenadas a ser uma
assíntota da hipérbole, essas duas linhas que, mesmo ca-
[15] minhando juntas, nunca se encontrarão? […] Há 400 anos,
o filósofo francês Descartes, o pai da filosofia e da mate-
mática moderna, precursor do idealismo, resumiu seu
pensamento na famosa frase: "Penso, logo existo". Hoje
nosso mundo, que tem pouco a ver com o do filósofo (não
[20] sei se mais profundo e iluminado ou mais superficial),
pode dizer: "Selfio, logo sou". Refiro-me a essa febre do
autorretrato analisada por sociólogos e psicólogos, e por
aqueles que se dedicam a farejar as tendências da socie-
dade.
[25] Essa moda do selfie servirá para entender melhor o
sentido da vida de hoje, com suas contradições, sofrimen-
tos e glórias? Há poucos dias, outro filósofo francês, Cha-
rles Taylor, afirmava em uma entrevista para Frances Ar-
royo neste jornal que "as pessoas hoje não têm claro o sen-
[30] tido da vida". […] Melhor ou pior, o mundo de hoje é, no
entanto, o nosso, e não podemos fingir que não existe. E
é um mundo diferente daquele dos filósofos gregos ou la-
tinos, embora às vezes com as mesmas contradições e dú-
vidas. As crianças do futuro talvez não voltarão a escrever
[35] com as mãos. As de hoje já sabem fotografar com o celu-
lar aos 2 anos. Mudamos porque continuamos vivos. Só
os mortos não mudam.
Essa moda do selfie, que dominou com força todo o
planeta e também o Brasil, é antes de tudo algo democrá-
[40] tico, já que é usada por cidadãos de todas as categorias
sociais e de todas as classes econômicas. Do presidente da
República ao garçom do bar, do milionário ao trabalhador
pobre das favelas.
Será mais do que uma moda? Etimologicamente, o
[45] selfie, que já transformamos em verbo, era um ato indivi-
dualista, um autorretrato. Aquele narcisismo inicial deu
lugar, no entanto, a algo mais importante: à socialização
da fotografia. O selfie individual foi pluralizado. Agora
predominam os retratos de dois ou em grupo. Será uma
[50] forma inconsciente, freudiana, de lutar contra a solidão e
para estar ciente do eu também existo? Precisamos de al-
guém ao nosso lado, sem o qual nosso narcisismo inicial
ficaria vazio, puro vício solitário?
Alguém me fez observar que, enquanto nos selfies
[55] individuais podem existir fotos mais sérias, praticamente
não há selfies de casais ou de grupo nos quais os interes-
sados não estejam sorrindo. Existe uma cumplicidade es-
pontânea nesses retratos? Mesmo em selfies com uma per-
sonalidade importante, que deveriam ser sérios, as pes-
[60] soas sempre estão sorrindo.
Os selfies nos ajudam a tomar consciência em uma
sociedade de anônimos, de que somos, de que valemos
algo, embora seja através da sombra de alguém mais im-
portante do que nós? Quando o selfie ocorre entre casais
[65] que se amam, entre pais e mães encantados com seus pe-
quenos ou entre amigos, nos dá uma convicção interior de
que não apenas existimos, mas que também somos, que
nos amam, que não rejeitam nossa presença e até querem
perpetuá-la.
[70] Já sei que muitos pensarão que a filosofia e a estética
moderna do selfie parecem mais uma banalidade em com-
paração à antiga e inteligente filosofia dos gregos e roma-
nos. No entanto, não nos esqueçamos de que nosso mundo
de hoje, tão criticado pela superficialidade e injustiças, é
[75] infinitamente melhor, quase em tudo, do que o de apenas
cem anos atrás. […] Os sorrisos festivos dos selfies pode-
riam ser até uma bela profecia do desejo inconsciente de
querer buscar um sentido menos doloroso e bélico para a
vida.
[80] […] Um selfie com os leitores? Obrigado.
Fonte: EL PAÍS Brasil - 21 AGO 2015 - http://brasil.elpais.com/brasil/2015/08/21/opinion/1440181987_784618.html
Assinale a alternativa que corresponde à tese defendida pelo autor do texto.
“Selfio, logo existo”
Juan Arias
Será o ‘selfie’ uma forma freudiana de luta contra a
solidão e de busca de um sentido para a vida?
O Brasil passa por um momento paradoxal. Tem-se
a impressão de que é um vidro quebrado. A crise econô-
[5] mica que gerou a política ou, talvez, o contrário, inflama
os ânimos. Ressoam palavras duras como "ódio", "vi-
gança" ou "traição". É o gosto amargo da divisão, do "nós
contra eles", ou da queixa "deles contra nós". E, no en-
tanto, como em um mundo que vibra simultaneamente em
[10] outro diapasão, os brasileiros nunca gostaram tanto
quanto hoje de estar juntos, de ser fotografados se abra-
çando, de fazer um selfie.
Estarão essas duas sociedades condenadas a ser uma
assíntota da hipérbole, essas duas linhas que, mesmo ca-
[15] minhando juntas, nunca se encontrarão? […] Há 400 anos,
o filósofo francês Descartes, o pai da filosofia e da mate-
mática moderna, precursor do idealismo, resumiu seu
pensamento na famosa frase: "Penso, logo existo". Hoje
nosso mundo, que tem pouco a ver com o do filósofo (não
[20] sei se mais profundo e iluminado ou mais superficial),
pode dizer: "Selfio, logo sou". Refiro-me a essa febre do
autorretrato analisada por sociólogos e psicólogos, e por
aqueles que se dedicam a farejar as tendências da socie-
dade.
[25] Essa moda do selfie servirá para entender melhor o
sentido da vida de hoje, com suas contradições, sofrimen-
tos e glórias? Há poucos dias, outro filósofo francês, Cha-
rles Taylor, afirmava em uma entrevista para Frances Ar-
royo neste jornal que "as pessoas hoje não têm claro o sen-
[30] tido da vida". […] Melhor ou pior, o mundo de hoje é, no
entanto, o nosso, e não podemos fingir que não existe. E
é um mundo diferente daquele dos filósofos gregos ou la-
tinos, embora às vezes com as mesmas contradições e dú-
vidas. As crianças do futuro talvez não voltarão a escrever
[35] com as mãos. As de hoje já sabem fotografar com o celu-
lar aos 2 anos. Mudamos porque continuamos vivos. Só
os mortos não mudam.
Essa moda do selfie, que dominou com força todo o
planeta e também o Brasil, é antes de tudo algo democrá-
[40] tico, já que é usada por cidadãos de todas as categorias
sociais e de todas as classes econômicas. Do presidente da
República ao garçom do bar, do milionário ao trabalhador
pobre das favelas.
Será mais do que uma moda? Etimologicamente, o
[45] selfie, que já transformamos em verbo, era um ato indivi-
dualista, um autorretrato. Aquele narcisismo inicial deu
lugar, no entanto, a algo mais importante: à socialização
da fotografia. O selfie individual foi pluralizado. Agora
predominam os retratos de dois ou em grupo. Será uma
[50] forma inconsciente, freudiana, de lutar contra a solidão e
para estar ciente do eu também existo? Precisamos de al-
guém ao nosso lado, sem o qual nosso narcisismo inicial
ficaria vazio, puro vício solitário?
Alguém me fez observar que, enquanto nos selfies
[55] individuais podem existir fotos mais sérias, praticamente
não há selfies de casais ou de grupo nos quais os interes-
sados não estejam sorrindo. Existe uma cumplicidade es-
pontânea nesses retratos? Mesmo em selfies com uma per-
sonalidade importante, que deveriam ser sérios, as pes-
[60] soas sempre estão sorrindo.
Os selfies nos ajudam a tomar consciência em uma
sociedade de anônimos, de que somos, de que valemos
algo, embora seja através da sombra de alguém mais im-
portante do que nós? Quando o selfie ocorre entre casais
[65] que se amam, entre pais e mães encantados com seus pe-
quenos ou entre amigos, nos dá uma convicção interior de
que não apenas existimos, mas que também somos, que
nos amam, que não rejeitam nossa presença e até querem
perpetuá-la.
[70] Já sei que muitos pensarão que a filosofia e a estética
moderna do selfie parecem mais uma banalidade em com-
paração à antiga e inteligente filosofia dos gregos e roma-
nos. No entanto, não nos esqueçamos de que nosso mundo
de hoje, tão criticado pela superficialidade e injustiças, é
[75] infinitamente melhor, quase em tudo, do que o de apenas
cem anos atrás. […] Os sorrisos festivos dos selfies pode-
riam ser até uma bela profecia do desejo inconsciente de
querer buscar um sentido menos doloroso e bélico para a
vida.
[80] […] Um selfie com os leitores? Obrigado.
Fonte: EL PAÍS Brasil - 21 AGO 2015 - http://brasil.elpais.com/brasil/2015/08/21/opinion/1440181987_784618.html
Marque V (verdadeiro) ou F (falso) para as alternativas abaixo, que tratam da estrutura do artigo de opinião. Podemos afirmar que o texto lido é um artigo de opinião, porque
( ) apresenta o tema, a defesa de uma tese e vários argumentos que ajudam a sustentá-la.
( ) a estrutura textual predominante é a de exposição de ideias e opiniões.
( ) há o uso predominante de verbos no tempo passado.
( ) há ausência completa de marcas de autoria, como pronomes e verbos em primeira pessoa.
( ) há presença de questionamentos, com objetivo de promover reflexão no leitor.
Com base nas considerações feitas, a alternativa correta é
“Selfio, logo existo”
Juan Arias
Será o ‘selfie’ uma forma freudiana de luta contra a
solidão e de busca de um sentido para a vida?
O Brasil passa por um momento paradoxal. Tem-se
a impressão de que é um vidro quebrado. A crise econô-
[5] mica que gerou a política ou, talvez, o contrário, inflama
os ânimos. Ressoam palavras duras como "ódio", "vi-
gança" ou "traição". É o gosto amargo da divisão, do "nós
contra eles", ou da queixa "deles contra nós". E, no en-
tanto, como em um mundo que vibra simultaneamente em
[10] outro diapasão, os brasileiros nunca gostaram tanto
quanto hoje de estar juntos, de ser fotografados se abra-
çando, de fazer um selfie.
Estarão essas duas sociedades condenadas a ser uma
assíntota da hipérbole, essas duas linhas que, mesmo ca-
[15] minhando juntas, nunca se encontrarão? […] Há 400 anos,
o filósofo francês Descartes, o pai da filosofia e da mate-
mática moderna, precursor do idealismo, resumiu seu
pensamento na famosa frase: "Penso, logo existo". Hoje
nosso mundo, que tem pouco a ver com o do filósofo (não
[20] sei se mais profundo e iluminado ou mais superficial),
pode dizer: "Selfio, logo sou". Refiro-me a essa febre do
autorretrato analisada por sociólogos e psicólogos, e por
aqueles que se dedicam a farejar as tendências da socie-
dade.
[25] Essa moda do selfie servirá para entender melhor o
sentido da vida de hoje, com suas contradições, sofrimen-
tos e glórias? Há poucos dias, outro filósofo francês, Cha-
rles Taylor, afirmava em uma entrevista para Frances Ar-
royo neste jornal que "as pessoas hoje não têm claro o sen-
[30] tido da vida". […] Melhor ou pior, o mundo de hoje é, no
entanto, o nosso, e não podemos fingir que não existe. E
é um mundo diferente daquele dos filósofos gregos ou la-
tinos, embora às vezes com as mesmas contradições e dú-
vidas. As crianças do futuro talvez não voltarão a escrever
[35] com as mãos. As de hoje já sabem fotografar com o celu-
lar aos 2 anos. Mudamos porque continuamos vivos. Só
os mortos não mudam.
Essa moda do selfie, que dominou com força todo o
planeta e também o Brasil, é antes de tudo algo democrá-
[40] tico, já que é usada por cidadãos de todas as categorias
sociais e de todas as classes econômicas. Do presidente da
República ao garçom do bar, do milionário ao trabalhador
pobre das favelas.
Será mais do que uma moda? Etimologicamente, o
[45] selfie, que já transformamos em verbo, era um ato indivi-
dualista, um autorretrato. Aquele narcisismo inicial deu
lugar, no entanto, a algo mais importante: à socialização
da fotografia. O selfie individual foi pluralizado. Agora
predominam os retratos de dois ou em grupo. Será uma
[50] forma inconsciente, freudiana, de lutar contra a solidão e
para estar ciente do eu também existo? Precisamos de al-
guém ao nosso lado, sem o qual nosso narcisismo inicial
ficaria vazio, puro vício solitário?
Alguém me fez observar que, enquanto nos selfies
[55] individuais podem existir fotos mais sérias, praticamente
não há selfies de casais ou de grupo nos quais os interes-
sados não estejam sorrindo. Existe uma cumplicidade es-
pontânea nesses retratos? Mesmo em selfies com uma per-
sonalidade importante, que deveriam ser sérios, as pes-
[60] soas sempre estão sorrindo.
Os selfies nos ajudam a tomar consciência em uma
sociedade de anônimos, de que somos, de que valemos
algo, embora seja através da sombra de alguém mais im-
portante do que nós? Quando o selfie ocorre entre casais
[65] que se amam, entre pais e mães encantados com seus pe-
quenos ou entre amigos, nos dá uma convicção interior de
que não apenas existimos, mas que também somos, que
nos amam, que não rejeitam nossa presença e até querem
perpetuá-la.
[70] Já sei que muitos pensarão que a filosofia e a estética
moderna do selfie parecem mais uma banalidade em com-
paração à antiga e inteligente filosofia dos gregos e roma-
nos. No entanto, não nos esqueçamos de que nosso mundo
de hoje, tão criticado pela superficialidade e injustiças, é
[75] infinitamente melhor, quase em tudo, do que o de apenas
cem anos atrás. […] Os sorrisos festivos dos selfies pode-
riam ser até uma bela profecia do desejo inconsciente de
querer buscar um sentido menos doloroso e bélico para a
vida.
[80] […] Um selfie com os leitores? Obrigado.
Fonte: EL PAÍS Brasil - 21 AGO 2015 - http://brasil.elpais.com/brasil/2015/08/21/opinion/1440181987_784618.html
O título “Selfio, logo existo” faz uma alusão clara à famosa frase do filósofo Descartes “Penso, logo existo”. Sobre essa alusão, pode-se afirmar que ela é
“Selfio, logo existo”
Juan Arias
Será o ‘selfie’ uma forma freudiana de luta contra a
solidão e de busca de um sentido para a vida?
O Brasil passa por um momento paradoxal. Tem-se
a impressão de que é um vidro quebrado. A crise econô-
[5] mica que gerou a política ou, talvez, o contrário, inflama
os ânimos. Ressoam palavras duras como "ódio", "vi-
gança" ou "traição". É o gosto amargo da divisão, do "nós
contra eles", ou da queixa "deles contra nós". E, no en-
tanto, como em um mundo que vibra simultaneamente em
[10] outro diapasão, os brasileiros nunca gostaram tanto
quanto hoje de estar juntos, de ser fotografados se abra-
çando, de fazer um selfie.
Estarão essas duas sociedades condenadas a ser uma
assíntota da hipérbole, essas duas linhas que, mesmo ca-
[15] minhando juntas, nunca se encontrarão? […] Há 400 anos,
o filósofo francês Descartes, o pai da filosofia e da mate-
mática moderna, precursor do idealismo, resumiu seu
pensamento na famosa frase: "Penso, logo existo". Hoje
nosso mundo, que tem pouco a ver com o do filósofo (não
[20] sei se mais profundo e iluminado ou mais superficial),
pode dizer: "Selfio, logo sou". Refiro-me a essa febre do
autorretrato analisada por sociólogos e psicólogos, e por
aqueles que se dedicam a farejar as tendências da socie-
dade.
[25] Essa moda do selfie servirá para entender melhor o
sentido da vida de hoje, com suas contradições, sofrimen-
tos e glórias? Há poucos dias, outro filósofo francês, Cha-
rles Taylor, afirmava em uma entrevista para Frances Ar-
royo neste jornal que "as pessoas hoje não têm claro o sen-
[30] tido da vida". […] Melhor ou pior, o mundo de hoje é, no
entanto, o nosso, e não podemos fingir que não existe. E
é um mundo diferente daquele dos filósofos gregos ou la-
tinos, embora às vezes com as mesmas contradições e dú-
vidas. As crianças do futuro talvez não voltarão a escrever
[35] com as mãos. As de hoje já sabem fotografar com o celu-
lar aos 2 anos. Mudamos porque continuamos vivos. Só
os mortos não mudam.
Essa moda do selfie, que dominou com força todo o
planeta e também o Brasil, é antes de tudo algo democrá-
[40] tico, já que é usada por cidadãos de todas as categorias
sociais e de todas as classes econômicas. Do presidente da
República ao garçom do bar, do milionário ao trabalhador
pobre das favelas.
Será mais do que uma moda? Etimologicamente, o
[45] selfie, que já transformamos em verbo, era um ato indivi-
dualista, um autorretrato. Aquele narcisismo inicial deu
lugar, no entanto, a algo mais importante: à socialização
da fotografia. O selfie individual foi pluralizado. Agora
predominam os retratos de dois ou em grupo. Será uma
[50] forma inconsciente, freudiana, de lutar contra a solidão e
para estar ciente do eu também existo? Precisamos de al-
guém ao nosso lado, sem o qual nosso narcisismo inicial
ficaria vazio, puro vício solitário?
Alguém me fez observar que, enquanto nos selfies
[55] individuais podem existir fotos mais sérias, praticamente
não há selfies de casais ou de grupo nos quais os interes-
sados não estejam sorrindo. Existe uma cumplicidade es-
pontânea nesses retratos? Mesmo em selfies com uma per-
sonalidade importante, que deveriam ser sérios, as pes-
[60] soas sempre estão sorrindo.
Os selfies nos ajudam a tomar consciência em uma
sociedade de anônimos, de que somos, de que valemos
algo, embora seja através da sombra de alguém mais im-
portante do que nós? Quando o selfie ocorre entre casais
[65] que se amam, entre pais e mães encantados com seus pe-
quenos ou entre amigos, nos dá uma convicção interior de
que não apenas existimos, mas que também somos, que
nos amam, que não rejeitam nossa presença e até querem
perpetuá-la.
[70] Já sei que muitos pensarão que a filosofia e a estética
moderna do selfie parecem mais uma banalidade em com-
paração à antiga e inteligente filosofia dos gregos e roma-
nos. No entanto, não nos esqueçamos de que nosso mundo
de hoje, tão criticado pela superficialidade e injustiças, é
[75] infinitamente melhor, quase em tudo, do que o de apenas
cem anos atrás. […] Os sorrisos festivos dos selfies pode-
riam ser até uma bela profecia do desejo inconsciente de
querer buscar um sentido menos doloroso e bélico para a
vida.
[80] […] Um selfie com os leitores? Obrigado.
Fonte: EL PAÍS Brasil - 21 AGO 2015 - http://brasil.elpais.com/brasil/2015/08/21/opinion/1440181987_784618.html
No texto, a voz passiva é predominantemente usada sem o agente da passiva. Nas alternativas abaixo, marque aquela em que o agente da passiva está presente.
“Selfio, logo existo”
Juan Arias
Será o ‘selfie’ uma forma freudiana de luta contra a
solidão e de busca de um sentido para a vida?
O Brasil passa por um momento paradoxal. Tem-se
a impressão de que é um vidro quebrado. A crise econô-
[5] mica que gerou a política ou, talvez, o contrário, inflama
os ânimos. Ressoam palavras duras como "ódio", "vi-
gança" ou "traição". É o gosto amargo da divisão, do "nós
contra eles", ou da queixa "deles contra nós". E, no en-
tanto, como em um mundo que vibra simultaneamente em
[10] outro diapasão, os brasileiros nunca gostaram tanto
quanto hoje de estar juntos, de ser fotografados se abra-
çando, de fazer um selfie.
Estarão essas duas sociedades condenadas a ser uma
assíntota da hipérbole, essas duas linhas que, mesmo ca-
[15] minhando juntas, nunca se encontrarão? […] Há 400 anos,
o filósofo francês Descartes, o pai da filosofia e da mate-
mática moderna, precursor do idealismo, resumiu seu
pensamento na famosa frase: "Penso, logo existo". Hoje
nosso mundo, que tem pouco a ver com o do filósofo (não
[20] sei se mais profundo e iluminado ou mais superficial),
pode dizer: "Selfio, logo sou". Refiro-me a essa febre do
autorretrato analisada por sociólogos e psicólogos, e por
aqueles que se dedicam a farejar as tendências da socie-
dade.
[25] Essa moda do selfie servirá para entender melhor o
sentido da vida de hoje, com suas contradições, sofrimen-
tos e glórias? Há poucos dias, outro filósofo francês, Cha-
rles Taylor, afirmava em uma entrevista para Frances Ar-
royo neste jornal que "as pessoas hoje não têm claro o sen-
[30] tido da vida". […] Melhor ou pior, o mundo de hoje é, no
entanto, o nosso, e não podemos fingir que não existe. E
é um mundo diferente daquele dos filósofos gregos ou la-
tinos, embora às vezes com as mesmas contradições e dú-
vidas. As crianças do futuro talvez não voltarão a escrever
[35] com as mãos. As de hoje já sabem fotografar com o celu-
lar aos 2 anos. Mudamos porque continuamos vivos. Só
os mortos não mudam.
Essa moda do selfie, que dominou com força todo o
planeta e também o Brasil, é antes de tudo algo democrá-
[40] tico, já que é usada por cidadãos de todas as categorias
sociais e de todas as classes econômicas. Do presidente da
República ao garçom do bar, do milionário ao trabalhador
pobre das favelas.
Será mais do que uma moda? Etimologicamente, o
[45] selfie, que já transformamos em verbo, era um ato indivi-
dualista, um autorretrato. Aquele narcisismo inicial deu
lugar, no entanto, a algo mais importante: à socialização
da fotografia. O selfie individual foi pluralizado. Agora
predominam os retratos de dois ou em grupo. Será uma
[50] forma inconsciente, freudiana, de lutar contra a solidão e
para estar ciente do eu também existo? Precisamos de al-
guém ao nosso lado, sem o qual nosso narcisismo inicial
ficaria vazio, puro vício solitário?
Alguém me fez observar que, enquanto nos selfies
[55] individuais podem existir fotos mais sérias, praticamente
não há selfies de casais ou de grupo nos quais os interes-
sados não estejam sorrindo. Existe uma cumplicidade es-
pontânea nesses retratos? Mesmo em selfies com uma per-
sonalidade importante, que deveriam ser sérios, as pes-
[60] soas sempre estão sorrindo.
Os selfies nos ajudam a tomar consciência em uma
sociedade de anônimos, de que somos, de que valemos
algo, embora seja através da sombra de alguém mais im-
portante do que nós? Quando o selfie ocorre entre casais
[65] que se amam, entre pais e mães encantados com seus pe-
quenos ou entre amigos, nos dá uma convicção interior de
que não apenas existimos, mas que também somos, que
nos amam, que não rejeitam nossa presença e até querem
perpetuá-la.
[70] Já sei que muitos pensarão que a filosofia e a estética
moderna do selfie parecem mais uma banalidade em com-
paração à antiga e inteligente filosofia dos gregos e roma-
nos. No entanto, não nos esqueçamos de que nosso mundo
de hoje, tão criticado pela superficialidade e injustiças, é
[75] infinitamente melhor, quase em tudo, do que o de apenas
cem anos atrás. […] Os sorrisos festivos dos selfies pode-
riam ser até uma bela profecia do desejo inconsciente de
querer buscar um sentido menos doloroso e bélico para a
vida.
[80] […] Um selfie com os leitores? Obrigado.
Fonte: EL PAÍS Brasil - 21 AGO 2015 - http://brasil.elpais.com/brasil/2015/08/21/opinion/1440181987_784618.html
Assinale a alternativa na qual o que não é um pronome relativo.